Publicado no jornal Folha de Votorantim de 13/05/2014
Elzo Savella
O conceito de desenvolvimento sustentável foi usado
oficialmente pela primeira vez em 1987 no relatório da Comissão Mundial sobre
Meio Ambiente e Desenvolvimento, o Relatório Brundtland, e consolidou-se a
partir de 1992 com a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente e o
Desenvolvimento, a Rio 92. Foi apresentado no Relatório Brundtland como “o
desenvolvimento que procura satisfazer as necessidades da geração atual, sem
comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazerem suas próprias
necessidades, significa possibilitar que as pessoas, agora e no futuro, atinjam
um nível satisfatório de desenvolvimento social e econômico e de realização
humana e cultural, fazendo, ao mesmo tempo, um uso razoável dos recursos da
terra e preservando as espécies e os habitats naturais”.
Apresentado dessa forma, o conceito parece conter as soluções para os
problemas ambientais e sociais, garantindo ainda a viabilidade econômica do desenvolvimento.
É difícil, portanto, num primeiro momento, nos declararmos contrários a tal
ideia. Mas ao analisarmos mais atentamente cada uma das duas palavras que
compõem o termo, logo veremos a contradição que elas trazem. Em nosso sistema
econômico, desenvolvimento sempre foi ligado a crescimento e, particularmente,
ao industrialismo. Essa é a lógica do modo de produção capitalista. Ora, se o
desenvolvimento representa crescimento constante e acesso cada vez maior aos
bens de consumo, consequentemente aumentando em escala o uso dos recursos
naturais, ele é, então, insustentável por sua própria natureza. Já o adjetivo
sustentável, agregado ao desenvolvimento, parece ser uma tentativa de mascarar
essa natureza insustentável, compondo uma contradição.
Diante dessa contradição do
“desenvolvimento sustentável” parece razoável que busquemos uma desvinculação
desses termos e nos ocupemos prioritariamente da sustentabilidade ou de uma
sociedade sustentável. Algumas definições nos trazem de forma simples alguns
conceitos interessantes. Uma abordagem que contempla exclusivamente a variável
ambiental parece interessante, pois o ambiental é o suporte do econômico e do
social:
“O conceito de sustentabilidade ambiental refere-se
às condições sistêmicas segundo as quais, em nível regional e planetário, as
atividades humanas não devem interferir nos ciclos naturais em que se baseia
tudo o que a resiliência do planeta permite e, ao mesmo tempo, não devem
empobrecer seu capital natural, que será transmitido às gerações futuras.”
(MANZINI & VEZZOLI)
Outra definição bastante interessante já contempla as variáveis social,
econômica, cultural e ambiental:
“Sustentabilidade é um conceito sistêmico,
relacionado com a continuidade dos aspectos econômicos, sociais, culturais e
ambientais da sociedade humana. Propõe-se a ser um meio de configurar a
civilização e atividades humanas, de tal forma que a sociedade, os seus membros
e as suas economias possam preencher as suas necessidades e expressar o seu
maior potencial no presente, e ao mesmo tempo preservar a biodiversidade e os
ecossistemas naturais, planejando e agindo de forma a atingir pró-eficiência na
manutenção indefinida desses ideais.” (www.sustentabilidade.org.br)
Porém, nos parece, que o conceito de sustentabilidade demandará algum
tempo para incorporar uma visão mais crítica a partir de uma maior elaboração
teórica, pois hoje o termo é muitas vezes usado de forma vaga para servir aos
mais diversos interesses quando querem demonstrar pretensos compromissos com a
continuidade principalmente dos aspectos ambientais.
Diante
da evidente insustentabilidade do desenvolvimento ligado ao modelo
produtivista/consumista, podemos concluir que sustentabilidade, entendida como
um conceito que se traduz num modelo de equidade social, diversidade cultural,
proteção ambiental e que ainda seja economicamente viável, só será possível com
a superação do atual modo de produção baseado no crescimento e na exploração. O
que não nos impede de, além de lutar por grandes transformações econômicas e
sociais, defender a aplicabilidade dos princípios da sustentabilidade hoje. Ou
então por dar um significado menos quantitativo e mais qualitativo ao
desenvolvimento, associando-o à qualidade de vida e justiça social.
Elzo
Savella é
professor, historiador, ambientalista, gestor ambiental, mestre em
sustentabilidade. savellax@gmail.com
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